CARTA ABERTA
Diante da ética adotada nos
dias de hoje, onde a relação com o semelhante depende em parte de quem é tido
como tal, vemos o aparente sucesso daqueles que guiados pelo ego tentam a
qualquer custo se apoderar ou possuir as coisas terrenas por intermédio da violência.
Para tais indivíduos,
sobretudo os que atuam "profissionalmente" na política, as demais
pessoas não representam um fim em si mesmas; ou seja, não são tratadas como
seres humanos dignos de cuidados e de atenção, mas, sim, como simples meio para
que os "eleitos" da politicagem, incluindo aí "os do
grupo", possam alcançar seus objetivos de posses materiais concretizados
pela tríade dinheiro, sexo e divertimento.
Desse modo, não há cidadãos
livres e autônomos, mas apenas súditos, vistos como inferiores e que, por isso,
devem tolerar com apatia e indiferença todos abusos ou tipos de violência
física e moral, a exemplo dos casos de assédio tão constantes na relação entre
governo e governados e, ainda, não insistirem na luta por seus, poucos, porém
legítimos direitos.
Em um insaciável anseio de
obtenção de benesses sociais que ampliem o poder de consumo e a consequente
satisfação material dos seus interesses privados, nossos políticos e todos
aqueles que desejam abarcar tudo aquilo que esteja ao seu alcance fazem parte
de uma deprimente massa que desconhece que o desapego é o único meio de possuir
algo e que a total libertação é a única posse real.
Reinando às custas da
violência mental e emocional que exercem sobre quem não comunga com suas ideias
e metas, esses sempre carismáticos líderes, seus agregados bem como todos que
levantam suas bandeiras, apresentam, costumeiramente, atitudes que visam a
reduzir o outro a uma coisa negando, assim,
sua condição de alguém semelhante. Numa perversa tentativa de apoderamento
das próprias pessoas ignoram também que quando alguém não quer ser possuído
nada e ninguém o pode possuir, ainda que o segurem e o prendam na mais segura e
humilhante masmorra.
Perseguidores e tiranos,
talvez, por herança de nossa origem histórica marcada pela escravidão e pela
ditadura, os políticos paternalistas ao empregarem a violência nunca possuirão
coisa alguma, embora a tenham preto sobre o branco, registrada e carimbada no
cartório, pois, tudo o que é violentamente possuído está envenenado por fluidos
tão maléficos que sempre causarão grande prejuízo para o seu possuidor. Além
disso, quem julga possuir as coisas da terra é, na verdade, possuído ou
possesso por elas.
Junto a uma cínica massa
subserviente e alienada, esses decadentes "representantes do povo"
têm por único princípio a ânsia de crescer, causando, dessa forma, a
inexistência da verdadeira solidariedade tanto entre seus próprios aliados
quanto entre os membros da comunidade em geral.
Em seu desapego à verdade confundem violência com poder, certamente,
alheios ao que diziam os antigos romanos: as coisas violentas não duram e,
também, por desconhecerem que aquele que é forte não tem necessidade de
ostentar a violência.
É, então, urgente que não só
os políticos como também os cidadãos e cidadãs, especialmente os que têm por
missão educar a juventude, busquem uma nova realidade social, política e
cultural capaz de promover a singularidade humana em suas melhores expressões e
de lutar por mudanças radicais em seu modo de viver e na própria configuração
política de uma sociedade hoje administrada por pessoas que esperam tudo do
mundo e que, portanto, das quais nada se pode esperar.
Não podemos continuar com
essa miopia política onde o cidadão é obrigado a servir como se fosse escravo
quando na realidade seu papel é servir espontaneamente como amigo da comunidade
e digno profissional, competente e concursado. Precisamos, enfim, de autênticos
representantes que nada esperem do mundo somente para si, pois desses o mundo
pode esperar tudo... Ou ao menos alguma coisa.
VALTER SILVA
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