
*Maiana Santana
O Projeto de Lei nº 6.787/2016, que tramitou na Câmara Federal e agora
está no Senado sob nº 38/2017 e que trata da proposta de REFORMA TRABALHISTA
vem encontrando resistência da sociedade civil, representada por diversos
segmentos, desde a sua tramitação na Câmara dos Deputados até os dias atuais
com a sua tramitação no Senado Federal.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ainda quando o Projeto de REFORMA
TRABALHISTA estava tramitando na Câmara dos Deputados, reuniu mais de 20
entidades, no dia 26 de abril de 2017 e debateram profundamente o texto
proposto pelo Governo Federal, resultando na elaboração conjunta de CARTA que
foi entregue formalmente ao Presidente da Câmara, Deputado Rodrigo Maia,
propondo que o REGIME DE URGÊNCIA da tramitação fosse retirado, para
oportunizar à sociedade civil maior debate do texto do Projeto de Lei.
Para isso, a OAB Nacional, por meio do seu Conselho Federal, conseguiu
reunir em ato público, as seguintes entidades: ANAMATRA –Associação
Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho; MPT – Ministério Público do Trabalho; ABRAT – Associação Brasileira dos Advogados
Trabalhistas; ANPT – Associação Nacional dos
Procuradores do Trabalho; ADJC –
Advogados e Advogadas pela Democracia Justiça e Cidadania; TST – Tribunal Superior do Trabalho;
Desembargadores dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs); AATDF –
Associação de Advogados Trabalhistas do Distrito Federal; INTERSINDICAL – Instituto de Lutas e Organização da
Classe Trabalhadora; AMAT –
Associação Mineira dos Advogados Trabalhistas; AATSP –
Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo; e demais Associações de
Advogados Trabalhistas de outros estados da Federação; JUTRA – Associação Luso Brasileira de Juristas do
Trabalho. CAADF – Caixa de Assistência
dos Advogados da OAB do Distrito Federal; Sindicato dos Advogados de
Minas Gerais; Sindicatos dos Advogados de
São Paulo e outros estados; além de inúmeras Centrais, Confederações,
Federações, Sindicatos e demais entidades representativas da sociedade civil
brasileira.
O movimento liderado pela OAB Nacional não parou aí e menos de um mês
depois da proposta de retirada do REGIME DE URGÊNCIA na tramitação do Projeto
de Lei da REFORMA TRABALHISTA entregue ao presidente da Câmara dos Deputados,
realizou-se no dia 16 de maio de 2017, a “Audiência Pública da OAB sobre
Reforma Trabalhista”, organizada pelas Comissões Nacionais de Direito Sindical, de Direitos Sociais e de Estudos Constitucionais da
OAB, depois de receberem as conclusões enviadas pelas
Seccionais (OAB estaduais), resultando na elaboração de Parecer pela Comissão
Relatora, apontando 18 inconstitucionalidades
encontradas no texto da REFORMA TRABALHISTAS em tramitação, agora, no Senado
Federal, que afetam diretamente os direitos sociais brasileiros,
a seguir relacionados:
1. Princípio da
Intervenção mínima na autonomia da vontade coletiva – isto é, a vontade
coletiva prevalece nos acordos e convenções coletivas de trabalho, devidamente
examinados pela Justiça do Trabalho. A proposta do Governo é restringir o exame
desses acordos e convenções pela Justiça Trabalhista, limitando esse exame,
exclusivamente, aos requisitos formais do negócio jurídico, tal como previsto
no Código Civil Brasileiro, criando, assim, o “princípio da intervenção mínima na autonomia de vontade coletiva”, ferindo dispositivo constitucional que
determina que “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito” , como dispõe o artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal,
garantindo o acesso à justiça.
2. Compensação de
jornada sem negociação coletiva – a Constituição Federal determina
que a sobrejornada do empregado, isto é, o trabalho exercido além do tempo
determinado em lei, tem “a compensação de horários e a redução
da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho (art. 7º, inciso
XIII, da C.F.), sendo, portanto, inconstitucional a proposta do
Governo, que quer a negociação direta entre empregado e empregador, sem a
necessidade de negociação coletiva de trabalho.
3. Prorrogação
habitual da jornada de trabalho mediante acordo – essa proposta
permite a instituição de regime ordinário de prorrogação de jornada de
trabalho, retirando a excepcionalidade da sobrejornada, tornando-a cotidiana, o
que viola o artigo 7º, inciso XIII, da C.F.
4. Ampliação do banco
de horas – pela proposta do Governo, o Banco de Horas será instituído mediante
acordo individual escrito, firmado entre empregado e empregador, diretamente,
com compensação em até 6 (seis) meses, o que viola a Constituição Federal que
determina no 7º, inciso XIII: “a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo
ou convenção coletiva de trabalho”.
5. Compensação mensal
de jornada – aqui, a proposta do Governo é que ocorra a compensação de jornada,
também, mediante acordo individual entre empregado e empregador, mesmo que seja
acordo tácito (sem estar escrito), para compensação dentro do próprio mês da
sobrejornada, o que viola o artigo 7º, inciso XIII, da C. F.,
que impõe a negociação mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho,
jamais individual e muito menos tácito (sem estar escrito).
6. Jornada 12 horas de
trabalho por 36 horas de descanso – O Governo propõe que esse
regime seja instituído por mero acordo individual, com possibilidade de
indenização do período de repouso, isto é, em vez do trabalhador ter o repouso
remunerado, teria esse período indenizado e continuaria trabalhando, impondo,
assim, jornada extenuante (cansativa) sem qualquer descanso, violando de uma só
vez, o 7º inciso XIII da C. F. (que exige negociação
coletiva), art. 1º, inciso IV (desconsidera o valor social do trabalho, negando
o direito ao descanso e remuneração) e o art. 7º, inciso XXII da C. F., que
impõe redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde,
higiene e segurança.
7. Inexigência de
licença prévia para jornada 12 por 36 em atividade insalubre – O Projeto em
tramitação prevê a exclusão da previsão de licença prévia para sobrejornada em
atividade insalubre, o que fere dispositivo constitucional que exige a licença
prévia, o que viola o 7º, inciso XXII, da C. F.
8. Admissão de
trabalho da empregada gestante e da lactante em ambiente insalubre – Pela proposta
do Governo, a empregada grávida ou que estiver amamentando pode trabalhar em
ambiente insalubre, o que significa grave risco à saúde tanto da mãe quanto da
criança antes de nascer (nascituro) ou depois de nascido (filho), violando
o 7º, inciso XXII da C. F.
9. Horário para
amamentação do filho – o Projeto prevê que os horários de
amamentação da empregada lactante deverão ser estabelecidos por meio de acordo
individual firmado entre empregada e empregador, o que viola o 7º, inciso XIII, da C. F., que determina a
existência de acordo coletivo e não acordo individual.
10. Trabalho
intermitente – é o trabalho em que a prestação de serviço com subordinação não é
contínua, ocorrendo alternância de períodos de prestação de serviços e períodos
de inatividade, determinados em horas, dias, ou meses, tornando a jornada de
trabalho fragmentada. Com essa proposta do Governo fica privilegiada a
necessidade empresarial, tornando insignificante a pessoa humana, na medida em
que torna possível a limitação ao exercício de direitos, a exemplo de férias,
13º, que são devidos a partir de 15 dias trabalhados no mês, o que é entendido
como afronta ao 7º, incisos IV e VIII da C. F., além
do que, fica evidente a precarização das relações de trabalho, ferindo
assim o “caput” (cabeça) do art. 7º, da C. F.
11. Prevalência de
acordo individual sobre o negociado – Está previsto no Projeto do
Governo que o acordo entre empregado e empregador prevalecerá sobre as
disposições de instrumentos coletivos de trabalho, quando se tratar de
empregado portador de diploma de nível superior, cujo salário seja igual ou
superior a duas vezes o limite máximo de benefícios do Regime Geral da
Previdência Social (atualmente, R$ 5.531,31), o que totaliza R$ 11.062,62,
tornando insignificante a negociação coletiva do trabalho, da atuação da
entidade sindical e tornando significativa a presunção de que o trabalhador que
é remunerado com esse valor ou maior, é considerado hipersuficiente e por isso
está em melhores condições de negociar o seu salário. Isso fragiliza o
empregado que, diante da possibilidade de perder o seu emprego, submete-se à
proposta do empregador. A proposta é inconstitucional, porque afasta a
imposição do acordo ou convenção coletiva de trabalho, além de discriminar uma
categoria de trabalhadores, ferindo o art. 7º, incisos VI, XIII e
XIV, da C. F.
12. Equiparação
salarial – exclusão da necessidade de homologação de quadro de carreira junto a
órgão público – A proposta do Governo pretende excluir a necessidade de homologação do
quadro de carreira adotado pelo empregador junto a órgão público, bem como seu
registro, o que contraria a Súmula 06 do TST (Tribunal Superior do Trabalho),
além de prevê que o empregador elabore norma interna de regulação do plano de
cargos e salários, permitindo, assim, que o empregador adote o plano que lhe
interesse. È inconstitucional, porque afronta o 7º,
inciso XXX da C.F., que proíbe diferenças de salários,
garantindo a isonomia (igualdade) salarial.
13. Extinção da
homologação por ocasião do fim do contrato de trabalho – Pretende o Governo
excluir a necessidade de homologação da rescisão do contrato de trabalho, pelo
sindicato ou MTE (Ministério do Trabalho e Emprego). Isso deixará o empregado
vulnerável, porque deixa de ter essa assistência, podendo renunciar a direitos,
submeter-se a fraudes no pagamento dos seus direitos, principalmente o
trabalhador leigo, ávido para receber as suas verbas rescisórias, o que
representa indiscutível RETROCESSO, porque viola o Princípio da Vedação de Proteção Deficiente.
14. Quitação anual das
verbas trabalhistas – O objetivo dessa proposta do Governo é reduzir os
passivos trabalhistas (descumprimento de obrigações trabalhistas e/ não
recolhimento de encargos sociais), permitindo que o empregado dê quitação anual
das verbas trabalhistas, assinando TERMO, mediante participação de sindicato da
categoria, o que aumentaria a possibilidade de fraudes, dificultando ao
trabalhador realizar futuras reclamações trabalhistas, abolindo, na prática,
direitos como a prescrição quinquenal (garantia
de ter assegurado direitos violados nos últimos cinco anos de trabalho) e a prescrição bienal ( reclamar direitos até
dois anos depois de sua violação).Fere o 7º, inciso XXIV da C.F. Portanto, depende de EC (Emenda Constitucional e nunca por legislação
ordinária).
15. Prevalência do
direito negociado sobre o direito legislado – Quando se tratar de
matérias relativas a acordo sobre a jornada de trabalho; banco de horas anual;
intervalo interjornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para
jornadas superiores a seis horas; adesão ao seguro-desemprego; plano de cargos,
salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como
identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;
regulamento empresarial; representante dos trabalhadores no local de trabalho;
teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente, remuneração por
produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração
por desempenho individual; modalidade de registro de jornada de trabalho, troca
do dia de feriado; enquadramento do grau de insalubridade/ prorrogação de
jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes
do Ministério do Trabalho; prêmios de incentivo em bens ou serviços,
eventualmente concedidos em programas de incentivo; participação nos lucros ou
resultados da empresa, o projeto pretende validar a pretensão patronal de
estabelecer com o sindicato dos trabalhadores condições menos favoráveis aos
empregados, o que fatalmente romperá com o projeto de melhoria das condições de
trabalho e de vida, consubstanciados no “caput” do art. 7º da C. F., cuja mudança depende de E C (Emenda
Constitucional).
16. Ausência de
contrapartidas na negociação coletiva de trabalho – As decisões do TST
(Tribunal Superior do Trabalho) e do STF (Supremo Tribunal Federal), formando
jurisprudências prevalentes já se posicionaram no sentido da necessidade de
serem concedidas contrapartidas aos trabalhadores na hipótese de condições
menos favoráveis aos empregados serem previstas em instrumentos coletivos.
Logo, trata-se de previsão constitucional, porque a Constituição Federal não
admite piora nas condições de trabalho e de vida apara os trabalhadores,
admitindo apenas melhoria, conforme determina o “caput”
do art. 7º, da C.F.
17. Limitação do valor
a ser pago em caso de condenação por dano extrapatrimonial – A proposta do
Governo pretende tabelar os valores devidos em caso de reparação por dano
extrapatrimonial, em flagrante desrespeito à personalidade do ofendido,
estabelecendo os seguintes parâmetros: 1) – ofensa de natureza leve, até três
vezes o último salário contratual do ofendido; 2) ofensa de natureza média, até
cinco vezes o último salário contratual do ofendido; 3) ofensa de natureza
grave, até vinte vezes o último salário contratual do ofendido; 4) ofensa de
natureza gravíssima, até cinquenta vezes o último salário contratual do
ofendido. Com isso, os grandes empregadores (grandes empresas) com grande poder
econômico, responderiam, dependendo da situação, com valores irrisórios,
desprezando-se o caráter pedagógico de indenizações de maior vulto. Tal
dispositivo violaria o princípio constitucional da igualdade, previsto no art.
5º, “caput”, da C. F., que assegura que “todos são iguais perante a lei”.
18. Matérias que não
podem ser objeto de negociação coletiva in pejus (MUDANÇA PARA PIOR) – O Projeto do
Governo prevê rol de matérias que não podem ser objeto de negociação coletiva
em condição pior do que a já prevista pela legislação em vigor. No entanto,
arrola situações exclusivas que podem mudar para pior, desde que resultante de
convenção coletiva. Mais do que isso, a proposta prevê que as normas de duração
de trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e
segurança do trabalho, o que contraria a jurisprudência do TST, porque q
Constituição envolve essas matérias, violando, portanto, a proposta do Governo,
o 7º da C.F.
Como se vê, as inconstitucionalidades apontadas pela OAB resultam de
profundo estudo, envolvendo indicações de diversas entidades representativas da
sociedade civil e analisadas cuidadosamente pelas Comissões de DIREITO SINDICAL, de DIREITOS SOCIAIS, e de
ESTUDOS CONSTITUCIONAIS, que deram suporte aoPARECER subscrito pela COMISSÃO RELATORA, composta pelos Conselheiros Federais da OAB, Bruno Reis de Figueiredo,
Eduardo Mourão e Flávio Pansiere, assistidos pelo advogado Raimar Machado, cujo texto, na
íntegra, foi publicado no BOLETIM DA OAB Nacional,
edição de 28 de junho de 2017.
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